quinta-feira, 10 de dezembro de 2009




Encontrei no Colóquio unilateralmente sentimental, livro de crônicas escritas por Manuel Bandeira entre os anos de 1962 e 1963, o seguinte texto:


Palavras inúteis



As palavras não têm a expressão que se quer.

Não conseguem nem vagamente traduzir

O que no coração vive a gente a sentir

Por uma incerta e incógnita mulher.

Uma mulher que custou tanto a vir

E quando veio fez de um poeta um homem qualquer,

Uma mulher que o pensamento anda a seguir

aonde for, esteja onde estiver,

Por quem sinto minh'alma reflorir

Sem dela pretender uma esmola sequer.



Mas não posso esconder. Esconder é mentir.

Meu silêncio é que pode, se quiser,

Sem palavras inúteis, repetir

O que n'alma me vai por aquela mulher.


Não pude ter dúvidas de que se trata de uma crônica, embora esteja certa de que é um poema. Foi proferida, num programa de rádio do Ministério da Educação e Cultura da época, como uma crônica. Escrita com toda a ternura do poeta, que não pôde deixar de sê-lo nem quando se embrenhava em outros trabalhos. Palavras inúteis é a única crônica que não é precedida de texto anterior ou posterior, o que reforça ainda mais o seu caráter duplo de poesia - crônica. Estas Palavras inúteis revelam a voz de uma simplicidade não pretenciosa daquele que se intitulava "poeta menor", mas que para mim, concordando com José Paulo Paes, é não menos que um poeta enorme.


Por Rafaela Santana



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